quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

"- pai, por que é que as estrelas morrem?
porque elas brilham muito em vida..."

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Espaço é pouco
Em Haikai, é dificil
Terminar o que

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Galo galo

(Ferreira Gullar)

O galo
no saguão quieto.

Galo galo
de alarmante crista, guerreiro,
medieval.

De córneo bico e
esporões, armado
contra a morte,
passeia.

Mede os passos. Pára.
Inclina a cabeça coroada
dentro do silêncio
- que faço entre coisas?
- de que me defendo?

Anda.
no saguão
O cimento esquece
o seu último passo

Galo: as penas que
florescem da carne silenciosa
e o duro bico e as unhas e o olhos
em amor. Grave
solidez.
Em que se apóia
tal arquitetura?

Saberá que, no centro
de seu corpo, um grito
se elabora?

Como, porém, conter,
uma vez concluído,
o canto obrigatório?

Eis que bate as asas, vai
morrer, encurva o vertiginoso pescoço
donde o canto rubro escoa.

Mas a pedra, a tarde,
o próprio feroz galo
subsistem ao grito.

Vê-se: o canto é inútil.

O galo permanece - apesar
de todo o seu porte marcial
- só, desamparado,
num saguão do mundo.
Pobre ave guerreira!

Outro grito cresce
agora no sigilo
de seu corpo; grito
que, sem essas penas
e esporões e crista
e sobretudo sem esse olhar
de ódio,
não seria tão rouco
e sangrento

Grito, fruto obscuro
e extremo dessa árvore: galo.
Mas que, fora dele,
é mero complemento de auroras.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Grito

Me sobe
num rompante
pela garganta
o fogo
a foice
a forca
a fada
e nada.
NADA(eu grito)!


Eu grito.
mas que grito eu?
grito os nãos
os sim
os ais
os tais
e principalmente
os porquês.


Grito.
Grito...
GRITO!
Mas me divirto
rolo
esfolo
e regrito
à condição
dos eternamente futuros.


GGGGRRRRRRRR
IIIIIITTTTOOOOO
OOOOOOOOO!!
o grito mudo
dos muros
das ruas
das cidades
das multidões:
O grito preso
inconcebível
imprevisível
despretencioso
que toma de assalto
rasgando asfalto
e corações.

Desabafo da madrugada

Vivemos à espera da morte
Cada dia passado neste mundo ingrato
Dela nos aproximamos mais
Mas jovens, sonhadores, semideuses
Ignoramos sua possível iminência.

Mas a possibilidade em si
Indiscutivelmente improvável
Ainda que tangível
Já diz por si só.
Remota, não nos atormenta a inexistência.

Bati-lhe os olhos e já sabia
Apaixonadamente perdido me entreguei
Mesmo sabendo que me entregava ao carrasco

A morte do mundano é certa
No entanto, como a vida
Seu fim é longínquo e inconcebível
Não conosco, por outro lado
Nosso amor já nasceu moribundo.

De nossa conexão terminal
Cujo desfecho previa desde os primórdios
Aproveitei cada segundo, cada suspiro
Pois subitamente este poderia ser o último

E a cada última gota sorvida
Da fonte que inexoravelmente se secaria
A esperança do infinito, do eterno, dava-me a vida.

Até que, tranqüilo, respirei
Mas onde estava o ar que me animava?
asfixiado e atônito olhei em volta
Caia no abismo, na escuridão, no nada

Morremos. Mas, incrédulo, vivo.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

O menino trovador
vê nas chuvas de verão
as gotas que outros viram

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

O escuro com o encontro

"Essa aceitação de um infinito inexplicável mata a subjetividade de tudo..."


Os quatro despertaram quase simultaneamente. Nada se via, nada nada, e isso assustava aos quatro. Era úmido, o frio, e abafado, o local. O medo preenchia a vasta escuridão. Por não compreenderem ao certo o que se passava, permaneceram calados. Um ruído, muito provavelmente o som do silêncio, parecia mantê-los grudados ao chão. Todos recolhidos em si mesmos, pouco tentavam ante a escuridão
O primeiro a pôr-se sobre as pernas hesitava então. Mas deu o arriscado passo. Viu que era bom, e espalhou a notícia aos outros, cuja presença acabara de atestar. A respiração uns dos outros era a única coisa capaz de romper o silêncio, e quando dialogaram pela primeira vez, foi um alívio.
Perguntaram-se o que fariam, e, assustados, calaram ante o desconhecido uma vez mais. Foi o primeiro vulto erguer a voz em tom de surpresa:
- Eu encontrei uma caixa de fósforos no bolso!
Era o que precisavam! Apressadamente ele tirou do bolso a caixinha, e constatou, em desalento: apenas sete palitos.
Acendeu o primeiro, rapidamente, e pode ver o rosto da moça ao seu lado. Parecia bela. Olhos bonitos, ela tinha... Quando ia enfim contemplar seu rosto na totalidade, o fósforo se apagou.
A fria realidade voltara. Apressadamente acendeu outro fósforo, desta vez podendo ver apenas em parte aquele rosto, ao seu lado, que o intrigava.
Foi comentar a terceira pessoa que lá se encontrava:
- Procuremos alguma saída. Você não vá gastar todos os fósforos de uma vez!
Concordou com ele, apesar de não tê-lo agradado o tom de autoridade que utilizara. Os dois rapazes puseram-se, então a tatear, buscando algo que os indicasse como sair dali. Ao perceber o afastamento deles, a moça, entre eles, temeu, e ajoelhou-se. Chorava copiosamente. Rezava pedindo ajuda e proteção, mas seu choro, como sua reza, trouxe-lhes apenas impaciência dos outros dois. Ela, recusava-se a colaborar.

O quinto fósforo terminara há pouco a sua combustão.
O quarto sujeito, que até então não se pronunciara, por fim, põe-se de pé e arrisca alguns passos. Enquanto os outros dois circundavam a escuridão, e cada vez mais se distanciavam e distorciam o quanto já houvessem descoberto, o espaço parecia aumentar a cada momento. Parecia estender-se para além de onde se podia chegar. O entorno de cada um dos quatro estava à mesma distância de qualquer saída possível. E tal consternação, a angústia de sentirem-se sós, num, impelia-o mais e mais a explorá-la, a compreendê-la. Ao outro, provocava-lhe um estranho desconforto, que a sua maneira buscava enfrentar, ou defender-se.
Ajoelhada, a bela moça era consolada pelos dois rapazes, cujas vozes se distanciavam cada vez mais. Todo esforço, porém, era vão. Suas lágrimas não pareciam bastar. O sexto fósforo ardia ao longe.
Vendo o choro incessante da dama, o quarto sujeito, e o mais calado entre eles, se aproxima. Perdida em suas salgadas preces que escorriam os olhos, ela mal percebe sua presença. Porém, quando se acende, distante, o sétimo e último fósforo, ela o vê, diante de si. Estende a ela o braço, como a convidar para algo que não sabia ao certo. Por que desconhecido motivo, ela se levantou e pegou em sua mão. Ele a puxa para perto, seu tórax contra o dela, ela o sente respirar. Quando vê, estão a bailar, ao som de uma belíssima valsa imaginária. O silêncio tornara-se em música, que a seu critério os embalava por aquela escuridão imensa.
O último fósforo, por fim, se apaga. E eles novamente estão perdidos, sozinhos; a dançar.

sábado, 5 de dezembro de 2009

Ba

Texto de autoria conjunta de Tigre, Chong e Lumière

Em preto-e-brando
,ou colorinco,
o caminho das estrelas
cinzeia

E se colore
arco-íro

Verde, lilás, laranja,
azul, papel

amarelo, pêra

pizza:
uma das coisas bonitas da vida,
bunda,
cu!
cu mesmo!

Deus... chave,
cheiro,
massacres
e motosserras

de Plutão para outras terras,
comendo cu e torresmo,
a minhoca das estrelas.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Poema para ti

Liberdade.
Te soletro,
Li-ber-da-de.
Te filosófo, te cientifíco, te legislatizo
e também te erro.
Te inverto,
te viro de ponta cabeça,
te leio de trás pra frente porque posso.
Edadrebil, Liberdade.
Sou livre!
E portanto te sangro,
te disseco,
te gotejo,
L
i
b
e
r
d
a
d
e.


Do nada te crio e ao nada te justifico.
Te compro feito puta,
te uso,
te exerço,
te amo!
E tambem te odeio.
Necessito de ti e para ti necessito.
Te possuo,
te estupro,
E te perco em devaneios.


Te glorifíco, te adoro, te idolátro
e nem ao menos conheço teu rosto.
A ti, por ódio, descreio
e por amor descrio.
Te escravizo,
te assassino,
te suicído,
te apago,
e sou livre.

Liberdade...
Liberda...
Liber...
Li...
...

quinta-feira

o tempo de física
de  mo  ra   mui   to
e é c
on
f
us
o

jáotempodehistóriapassarapidinho

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

A ilha do amigo

Mesmo que a comida começasse a parecer-lhe repetitiva, mesmo que o sol começasse a queimar-lhe o corpo, mesmo assim ele sorria. Por que afinal, era o que lhe restava. Já faziam uns quatro ou cinco dias que seu barco naufragara; não sabia direito, estava meio desorientado. Culpa da comida pouca, talvez, ou quem sabe a insolação.
Nenhum sinal de vestígios ou dos outros tripulantes. Sorte ou azar sobreviver? Ainda não se dera conta da tristeza dos fatos. Estava sozinho, perdido, indefinidamente. Nessas horas faz-se valer a sobrevivência, tristeza não tem vez. Cogitou uma mitose, queria um amigo para conversar, mas lembrou-se que os mamíferos não possuíam tal capacidade de duplicação. Riu-se. Lembrou também das aulas de biologia, dos tempos de escola. Bons tempos aqueles...
Se lhe coubesse a decisão, quedaria eternamente naquelas boas memórias. Mas a maré crescente logo o trouxe de volta à escaldante realidade. E pela primeira vez entristeceu. As costas ardiam, o coco, sua fonte de alimento e bebida, já estava quase acabando; não sabia quanto tempo mais agüentaria.
Que saudade dos amigos!, da família! Queria falar, botar pra fora, expressar-se, mas pra quem? Escrevia SOS’s na areia, enfeitava-os, aprimorava-os, mas alguém os avistaria?
Quando percebeu estar à margem da loucura, resolveu extravasar. No tronco do coqueiro, embaixo do qual dormia, desenhou um rosto. Para isso usou uma pequena pedrinha pontiaguda que encontrou, e na falta de um nome melhor, chamou-o Amigo. Amigo mesmo, não Amiga. Tal era o ócio em que se encontrava que pensou cada pequeno detalhe de sua personalidade. Julgou melhor fazê-lo homem para que pudessem desfrutar de uma maior afinidade. Imagina se ele se apaixona? Agüentaria estar perdido e ainda por cima mal-amado? Prevenção nunca é demais.
Amigo era um bom ouvinte, podia falar pouco, mas ouvia como ninguém.
Certa noite, a lua, de tão bonita que estava, comoveu o homem. E sabem como é, ele desatou a chorar. Apercebeu-se de uma possibilidade angustiante: talvez nunca o encontrassem! Talvez ficasse ali o resto de sua vida. Quem sabe a correnteza não o levou num percurso inesperado, onde ninguém jamais o procuraria. Ou talvez fosse aquela ilhota o último pedaço de terra desconhecido em nosso planeta, e por isso ninguém pensaria em procurá-lo lá. Até quando levaria adiante aquela farsa de conversar com uma árvore?
Mas por mais desesperadoras que fossem as possibilidades, algo surpreendente, inesperado, até, dizia-lhe que tudo acabaria bem. Um pressentimento, uma fé, uma ilusão. Mas que importava seu motivo ou sua origem, se tanto lhe apaziguava a mente. E ele riu uma vez mais. Deixou a pedra à beira-mar em que se sentava e foi para debaixo do coqueiro; porém, sem as lágrimas nos olhos de agora há pouco. Foi sorrindo, feliz.
Deve ter sonhado com os anjinhos essa noite, pena que o Amigo não teve a chance de perguntar. Mas o Amigo jura que foi acidentalmente que deixou cair um coco bem na cabeça do companheiro homem.

Sofisma do acidente

Quando ela passa, suas curvas - turvas - que a tantos apetecem e em nada me agradam atordoam. Ela se mostra indiferente – e mente -, a maliciosa. Eu, o ser frio e racional – secretamente passional – não atino. E morro por tal – já que isto me é vital. Olhar, entender, escrutinar – desfigurar -; vivo disso. Minhas contas e retas – quietas então – me abandonam. O chão, plano que desenhei com o maior esmero, segue o exemplo disto – existo? – e afunda.

Eu, pobre – pobre -, mesmo consciente, a sigo – me suicido. Empurra-me a malvada, mas ao passo que me distancio – vivo! –, aproximo. O emaranhado de equações que criei para me proteger – e prender – pouco sentido tem quando se trata dela. Morro? Morro? Morro? Vivo! Vivo! Vivo!

Movimento Machista

A minha geração me entristece
Nossas mulheres não são homens
Nossos homens, por outro lado, são mulheres
Apenas em seu estado embrionário, contudo

É isso! Nossos homens são menininhas!
E já me vejo em 20 anos na Parada do Orgulho Masculino..

(que será reprimida por nossas mães.. quero dizer, mulheres)

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Sobre a noite

inúmeras vozes narram
o inumerável; ausências castas
sobre as quais se encaminha
a madrugada

a noite é tão mais escura à noite
tão mais fria

a dimensão do escuro
não cabe em si mesma
e talvez por isso nos falte
compreender
a imensidão da noite

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Psicostasia

Duas belas moças se aproximaram de Osíris para que o Deus dos mortos pudesse pesar seus corações, sem que pudessem deixar de se inquietar perante a notável presença da besta híbrida sob os seus pés. A primeira delas sentia uma lufada de medo, renovada a cada olhadela que ela se arriscava a dar em direção à fera. Já a segunda tinha tanto medo de sentir medo que se ateve a certeza da leveza do seu coração.

Como ele poderia pesar mais do que o devido? Refletindo mais sobre a questão, ele não poderia pesar nada em absoluto! Afinal, ela havia vivido uma vida irretocável. A outra, infelizmente, não podia dizer o mesmo. Não é possível que se diga com precisão, mas provavelmente isto aumentava o seu nervosismo. De uma forma ou de outra, ela apenas esperava o momento no qual o prato da balança que sustentava o seu coração, tendo sido este posto em oposição a uma mera pluma, decairia, sentenciando-a à inexistência.

Sua surpresa, portanto, não poderia ter sido maior quando de olhos bem apertados para evitar um último contato com a monstruosa boca do seu algoz ela escutou da voz de Osíris. Ela estava livre para iniciar a sua jornada no mundo dos mortos. Após a certeza do fim, da agonia máxima, a moça estava em êxtase. A alegria mais intensa e genuína inundou o seu corpo, refletindo-se em cada centímetro do seu corpo. Era como se fosse de fato possível sentir a felicidade entrando em cada uma das suas células.

A segunda, ainda munida de sua inabalável segurança, entregou o seu coração e o admirou com tranqüilidade à espera do anúncio que resultaria na já esperada sentença. Um sorriso brotou-lhe à face em seguida. Um sentimento levemente quente e acolhedor se irradiou em sua superfície. Uma felicidade rasa, porém familiar. Não que isto a afetasse, vale a pena ressaltar, já que ela não era capaz de conceber a alegria como um sentimento multifacetado e diferente daquilo a que fora acostumada.

Não que fosse durar muito mais tempo de uma forma ou de outra, mas a evasão da sua felicidade deu-se de maneira mais rápida do que lhe era peculiar. Ao erguer seus olhinhos vitoriosos em direção a Osíris, o Deus não só permanecia calado, como era possível identificar um traço de incredulidade na sua fisionomia.

- Não é bom? – perguntou a moça, um pouco atônita nesse momento – Quero dizer, o meu coração é mais leve que a pluma! Não atesta a veracidade do que digo o fato do prato em que meu coração está alojado ter se erguido acima da pluma? Isto não é leve o suficiente?

- Excessivamente bom – respondeu o Deus do Mundo das Sombras - Segue teu caminho na morada dos mortos, você ainda possui toda uma eternidade para entender que a felicidade só existe em oposição à tristeza, a conquista em oposição à desilusão. Ao tomar uma rosa às mãos é difícil ser poupado pelos seus espinhos. Ainda assim, a rosa vale o corte, assim como o sorriso vale o choro.

E ela de fato chorou genuinamente pela primeira vez na sua vida. Osíris sorriu. Ele sabia que tinha salvado aquela bela moça.